RECURSO – APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PLATAFORMA DIGITAL DE VENDAS. SUSPENSÃO DE CONTA COMERCIAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA MITIGADA. INVIABILIDADE. EMPRESA COMERCIAL. AUSÊNCIA DE HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA OU ECONÔMICA. INCIDÊNCIA AFASTADA. LUCROS CESSANTES. PROVA DO PREJUÍZO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO LUCRO LÍQUIDO. PLANILHA COM MÉDIA DE FATURAMENTO BRUTO. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO IDÔNEA SOBRE ESTOQUE E CUSTOS OPERACIONAIS. PEDIDO DE
(TJSC; Processo nº 5015059-79.2020.8.24.0039; Recurso: recurso; Relator: Juiz MARCELO CARLIN; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:6976243 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5015059-79.2020.8.24.0039/SC
RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN
RELATÓRIO
Trato de apelação cível interposta por Terrasul Terraplanagem Construtora LTDA. em face da sentença proferida nos autos n.º 5015059-79.2020.8.24.0039, sendo a parte adversa Expresso São Miguel S/A.
Por brevidade, transcrevo, em relação à tramitação em primeira instância, o relatório da sentença (evento 37.1):
TERRASUL TERRAPLANAGEM CONSTRUTORA LTDA. propôs ação condenatória, pelo procedimento comum, em face de EXPRESSO SÃO MIGUEL LTDA. alegando, em suma, que presta serviços de terraplanagem, utilizando-se de tratores e de outros equipamentos para a realização de suas atividades. Disse que, em 22-11-2019, encaminhou para conserto o redutor de giro de seu veículo por intermédio da ré, que presta serviço de transporte, o qual foi devidamente consertado e devolvido em 29-11-2019 pela transportadora, com previsão de entrega em 30-11-2019. Entretanto, referido equipamento foi extraviado pela ré, o que lhe obrigou a fazer a aquisição de nova peça, que foi entregue somente em 9-1-2020. Disse que tinha contrato de prestação de serviço em execução e ficou impedido de fazer uso do equipamento durante 27 dias, deixando de lucrar R$ 56.262,60. Por isso, requereu a procedência do pedido e a condenação da ré ao pagamento de R$ 56.262,60.
Devidamente citada, a ré compareceu à audiência e, não obtida conciliação, ofereceu contestação aduzindo que não foi pactuado data de entrega da mercadoria e entrou em contato com a autora para indenizá-la pelo valor declarado da peça extraviada, mas obteve resposta negativa, ao argumento de que a peça possuía valor menor. Disse que pelo contrato de transporte sua responsabilidade está limitada ao valor declarado. Sustentou que não há provas dos lucros cessantes, de que a peça adquirida seria realmente em substituição à peça extraviada e de que a autora desembolsou o valor indicado na nota fiscal da nova peça. Disse que a autora explora outros ramos de atividade, não dependendo exclusivamente da prestação do serviço de destoca para auferir lucros. Impugnou os documentos juntados. Pugnou a improcedência.
Houve réplica.
Conclusos os autos, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
Pelo exposto, julgo improcedente o pedido formulado por TERRASUL TERRAPLANAGEM CONSTRUTORA LTDA. em face de EXPRESSO SÃO MIGUEL LTDA., condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa [CPC, art. 85, § 2°].
Irresignada, a parte apelante, em sua insurgência, pugnou pela reforma da decisão, com amparo nos seguintes argumentos (evento 45.1): a) reconhecimento incontroverso do extravio; b) paralisação da máquina por 27 dias e prejuízo correspondente; c) suficiência dos documentos juntados para comprovar lucros cessantes; d) inviabilidade prática de fiscalização diária da produção no local da obra; e e) impossibilidade econômica e operacional de substituir o equipamento ou realizar locação.
Intimada, a parte adversa apresentou contrarrazões (evento 51.1).
Após, ascenderam os autos a esta Instância.
Distribuídos, vieram-me conclusos.
É o relatório.
VOTO
1 Diante da tempestividade e observados os demais requisitos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.
2 No mérito, adianto que o recurso não merece provimento.
A controvérsia recursal cinge-se à pretensão de reparação por lucros cessantes decorrentes do extravio de peça a qual havia sido remetida para conserto, o que teria ocasionado paralisação de equipamento da recorrente por 27 dias.
O extravio é incontroverso. A questão central é saber, portanto, se a autora comprovou, de forma idônea, o efetivo lucro que razoavelmente deixou de auferir no período alegado, posto que este é o único pleito da presente ação.
Nos termos dos arts. 402 e 403 do Código Civil, a indenização, nas hipóteses de inadimplemento contratual, pode abranger o que o credor efetivamente perdeu (danos emergentes) e o que razoavelmente deixou de lucrar (lucros cessantes), desde que demonstrados o dano e o nexo causal.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, os lucros cessantes são "[...] a frustração da expectativa de lucro. É a perda de um ganho esperado" e para que seja caracterizado, em regra, "(...) não basta a simples possibilidade de realização do lucro, mas também não é indispensável a absoluta certeza de que este se teria verificado sem a interferência do evento danoso. O que deve existir é uma probabilidade objetiva que resulte do curso normal das coisas e das circunstâncias especiais do caso concreto" (Direito das Obrigações. vol. 6, tomo II. 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 2002. p. 80-81).
Em outras palavras, não é preciso ter certeza de que haveria lucro, mas deve existir uma probabilidade real e concreta de que ele ocorreria, considerando o curso normal dos fatos e as circunstâncias do caso.
Acontece que tal probabilidade deve ser demonstrada de forma concreta pela parte interessada, considerando que "o ônus da prova incumbe a quem tenha feito a alegação [...], se no momento de proferir decisão de mérito o juiz verifica que alguma alegação não está suficientemente provada, deve proferir decisão contrária a quem a tenha feito. Daí a razão pela qual também há muitos séculos se afirma que alegar e não provar é como não alegar (allegatio et non probatio quasi non allegatio)" (CÂRAMA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro, 4.ª edição. p. 228).
Logo, em matéria de lucros cessantes, o autor deveria ter comprovado, no caso concreto: a) a paralisação efetiva da atividade; b) a impossibilidade de execução do contrato por ausência da peça; c) a produtividade média e a remuneração pactuada no período; e d) a inexistência de medidas substitutivas razoáveis que pudessem mitigar o prejuízo, à luz da boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil).
No caso, contudo, a prova produzida não supera o padrão probatório exigido.
O apelante limita-se a juntar declaração unilateral e documentos relativos à prestação de serviços em ano anterior (2018), sem qualquer lastro contábil contemporâneo aos fatos (novembro/2019 a janeiro/2020) que permita inferir, com segurança, a receita diária do contrato apontado, a produtividade real do equipamento, a quantidade de hectares trabalhados ou o preço por unidade de medida.
Inexiste, por exemplo, apresentação de notas fiscais emitidas e não adimplidas por suposta paralisação, ordens de serviço diárias, relatórios de campo firmados, livro-caixa, extratos contábeis, contrato com cláusulas de produtividade e valor, ou qualquer outro elemento objetivo que converta a mera alegação de perda de ganho em dado verificável.
Nesse sentido, é indispensável demonstrar concretamente o ganho frustrado e sua razoabilidade. A simples menção à “produtividade por hectare”, sem prova do preço contratado e do cronograma de execução, não satisfaz o ônus legal.
Além disso, em relação à dificuldade de fiscalização diária em razão da distância e do acesso ao local de serviço, cabia ao credor, que se diz prejudicado, organizar e conservar documentação mínima idônea para lastrear a pretensão indenizatória, ainda que a rotina de campo seja desafiadora.
Também não se demonstrou o nexo causal entre o extravio e a alegada perda integral de faturamento por 27 dias.
Não há prova de que a autora não pudesse empregar equipamento substituto próprio ou de terceiros (locação), ao menos parcialmente, para reduzir o impacto do evento, nem de que tenha envidado esforços nesse sentido.
A omissão em adotar providências mitigatórias razoáveis (que se impõe pelos deveres anexos de cooperação e lealdade contratual) rompe ou, ao menos, enfraquece o liame causal necessário à condenação por lucro perdido integral no período.
Ressalto, ademais, que o limite indenizatório do art. 750 do Código Civil (atinente ao valor constante do conhecimento de transporte) incide especificamente sobre o extravio/dano da carga.
Ainda que isso não obste, em tese, a postulação de outros prejuízos decorrentes do inadimplemento, tal pretensão permanece condicionada à prova do efetivo dano e de sua extensão, o que, como visto, não ocorreu.
Assim, à míngua de comprovação do fato constitutivo (art. 373, I, do CPC), correta a improcedência decretada na origem.
Sobre o tema:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PLATAFORMA DIGITAL DE VENDAS. SUSPENSÃO DE CONTA COMERCIAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA MITIGADA. INVIABILIDADE. EMPRESA COMERCIAL. AUSÊNCIA DE HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA OU ECONÔMICA. INCIDÊNCIA AFASTADA. LUCROS CESSANTES. PROVA DO PREJUÍZO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO LUCRO LÍQUIDO. PLANILHA COM MÉDIA DE FATURAMENTO BRUTO. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO IDÔNEA SOBRE ESTOQUE E CUSTOS OPERACIONAIS. PEDIDO DE JULGAMENTO ANTECIPADO. INEXISTÊNCIA DE PROVA MÍNIMA DO DANO. ÔNUS DA PROVA NÃO CUMPRIDO. ART. 373, I, DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO CONFIGURADA. ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 85, § 11, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível n.° 5042910-91.2023.8.24.0038, da 7ª Câmara de Direito Civil do , rel. Haidée Denise Grin, j. 05/06/2025).
3 Nos termos do art. 85, § 11, do CPC, majoro os honorários advocatícios de 10% para 12% sobre o valor da causa, em razão do trabalho adicional em grau recursal.
4 Ante o exposto, voto no sentido de conhecer e negar provimento à apelação.
assinado por MARCELO CARLIN, Juiz Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6976243v25 e do código CRC 4a6cb4f9.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCELO CARLIN
Data e Hora: 14/11/2025, às 16:57:53
5015059-79.2020.8.24.0039 6976243 .V25
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:44:00.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Documento:6976244 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5015059-79.2020.8.24.0039/SC
RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN
EMENTA
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES DECORRENTES DE EXTRAVIO DE MERCADORIA DURANTE TRANSPORTE. AUSÊNCIA DE PROVA CONCRETA DO PREJUÍZO. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. DESPROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta por empresa que alegou ter sofrido lucros cessantes em razão do extravio, pela transportadora, de peça essencial à execução de contrato de prestação de serviços. Sentença julgou improcedente o pedido indenizatório, por ausência de comprovação dos prejuízos alegados.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. A questão em discussão consiste em saber se houve comprovação idônea do lucro que a autora razoavelmente deixou de auferir em decorrência do extravio de peça por transportadora.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A indenização por lucros cessantes exige demonstração concreta da perda de ganho provável, considerando a paralisação efetiva das atividades, a ausência de substituição viável da peça e a produtividade média pactuada no contrato.
4. A parte autora não apresentou documentos contábeis contemporâneos aos fatos que permitissem aferir com segurança a receita diária, o cronograma contratual ou a produtividade efetiva da máquina no período.
5. Ausência de elementos objetivos, como notas fiscais, relatórios técnicos, ordens de serviço, contrato com cláusulas específicas de remuneração e cronograma. Inexistência de provas que convertam a alegação em dado verificável.
6. Omissão de providências para mitigação dos danos e insuficiência do nexo causal entre o extravio e a alegada paralisação integral da atividade embasam a improcedência da pretensão indenizatória.
7. Aplicação do art. 373, I, do CPC, com ônus da prova não atendido. Sentença mantida.
IV. DISPOSITIVO E TESE
8. Apelação cível conhecida e desprovida.
Tese de julgamento: “1. A indenização por lucros cessantes exige prova concreta da paralisação das atividades e do ganho frustrado. 2. Ausente comprovação idônea dos lucros cessantes e do nexo causal com o extravio da peça, é indevida a reparação pretendida”.
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 402, 403 e 422; CPC, arts. 373, I, e 85, § 11.
Jurisprudência relevante citada: Apelação Cível n.° 5042910-91.2023.8.24.0038, da 7ª Câmara de Direito Civil do , rel. Haidée Denise Grin, j. 05/06/2025.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos do decidiu, por unanimidade, conhecer e negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por MARCELO CARLIN, Juiz Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6976244v7 e do código CRC 75dd7559.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARCELO CARLIN
Data e Hora: 14/11/2025, às 16:57:53
5015059-79.2020.8.24.0039 6976244 .V7
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:44:00.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas
Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 19/11/2025
Apelação Nº 5015059-79.2020.8.24.0039/SC
RELATOR: Juiz MARCELO CARLIN
PRESIDENTE: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
PROCURADOR(A): NEWTON HENRIQUE TRENNEPOHL
Certifico que este processo foi incluído como item 65 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 19:29.
Certifico que a 2ª Câmara Especial de Enfrentamento de Acervos, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª CÂMARA ESPECIAL DE ENFRENTAMENTO DE ACERVOS DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz MARCELO CARLIN
Votante: Juiz MARCELO CARLIN
Votante: Desembargador EDUARDO GALLO JR.
Votante: Desembargador Substituto DAVIDSON JAHN MELLO
MARCIA CRISTINA ULSENHEIMER
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:44:00.
Identificações de pessoas físicas foram ocultadas